REPORTAGEM ESPECIAL: Mesmo com atuação do MPRO, Rondônia tem crescimento nas denúncias de violência contra idosos
Nas paredes que deveriam abrigar afeto até dos próprios filhos, surgem gritos de dor; estado tem aumento nos abusos contra pessoas de mais de 60 anos

Por Felipe Corona – TVC Amazônia
Os últimos números atuais (apesar de serem do primeiro semestre de 2023), indicam uma situação triste: Rondônia registrou 267 denúncias de violência contra pessoas idosas, um salto em relação às 227 notificações feitas no mesmo período de 2022. Os dados, divulgados pelo Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), ligam um alerta que já não pode ser ignorado.
“Infelizmente, o que temos visto é um crescimento contínuo das ocorrências, especialmente em casos de abandono e tentativas de institucionalização forçada [de levá-los a uma entidade que cuida de idosos]”, lamenta o promotor de Justiça Pablo Hernandez Viscardi, da 9ª Promotoria de Justiça de Porto Velho, especializada na defesa das pessoas idosas.
Segundo ele, essas medidas, em muitos casos, não se justificam e revelam uma tentativa de afastar o problema, em vez de resolvê-lo.
Os números não mentem: abril de 2023 foi o mês com maior número de denúncias no primeiro semestre – 62 ao todo. E, ao longo do ano, esse cenário só se agravou: em julho, foram registradas 74 denúncias, elevando para 368 o número de casos. Desses, mais da metade ocorreram dentro da própria casa da vítima – o lugar onde, teoricamente, deveria reinar o cuidado.
Onde está o perigo
A face mais comum da violência? A financeira. “O crime mais recorrente é o previsto no artigo 102 do Estatuto da Pessoa Idosa, relacionado à apropriação de rendimentos. Muitos familiares acreditam, equivocadamente, que têm direito aos proventos dos idosos e acabam os utilizando em benefício próprio”, explica Viscardi.
Não à toa, os agressores, em sua maioria, são os próprios filhos. Alguns, afirma o promotor, justificam seus atos alegando dificuldade em lidar com os cuidados exigidos por doenças como o Alzheimer.
Em meio a tantas histórias de dor, algumas ainda têm perspectivas de esperança. Em um dos casos recentes, uma senhora em situação de vulnerabilidade foi acolhida pelos netos que viviam no Paraná, segundo o MPRO. “Eles nos disseram que jamais permitiriam que a avó passasse por aquilo. É nesses gestos que encontramos força para continuar”, conta o promotor.
Mas há também relatos que cortam fundo no peito, como lâminas afiadas. Como o de um idoso diagnosticado com Alzheimer, que viu sua esposa anular o casamento após o diagnóstico. Os filhos, igualmente ausentes, o deixaram abandonado. “Foi preciso ajuizar uma ação judicial para que a assistência a ele fosse garantida”, lembra Viscardi.
Em outros casos, os idosos escolheram o caminho da solidão: preferem viver sozinhos, mesmo diante das limitações impostas pela idade. “Muitos dizem que a autonomia é tudo que lhes resta. Outros, que não querem abandonar o lar onde passaram a maior parte da vida”, indica o promotor de Justiça do MPRO.

Cuidados
Segundo o representante da instituição, a promotoria atua de forma integrada com a equipe técnica do Ministério Público e com a Secretaria Municipal de Assistência Social e da Família (Semasf) em Porto Velho. Quando necessário, realizam visitas domiciliares, produzem relatórios sociais e, em último caso, determinam o acolhimento institucional do idoso – sempre como medida excepcional.
Apesar das ações de conscientização, como a campanha “Junho Violeta”, promovida pela Prefeitura de Porto Velho, o futuro ainda parece nebuloso. “Com o envelhecimento da população e a baixa taxa de natalidade, a tendência é de crescimento nos casos de violência”, alerta o promotor.
A legislação existe: o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) prevê pena de até um ano de reclusão para os agressores – podendo ser aumentada conforme a gravidade da violação. Mas, para além da punição, é a conscientização que pode, de fato, mudar o cenário.
Enquanto isso, permanece o apelo do Ministério Público: para as pessoas não se calarem e denunciarem.
“A velhice deveria ser abrigo. Em vez disso, vemos a casa se tornar cativeiro, e o sangue, laço que aprisiona. Precisamos resgatar o respeito pelos que vieram antes. Eles não merecem viver seus últimos dias como se fossem invisíveis”, finaliza Pablo Hernandez Viscardi, promotor de Justiça.

Onde denunciar
Denúncias podem ser feitas por telefone, WhatsApp, Telegram, e-mail, pelos sites de órgãos públicos, pelo aplicativo Direitos Humanos e até mesmo, indo diretamente nas sedes dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).
Em Porto Velho, o Creas fica localizado na Av. Pinheiro Machado, 1718 – Bairro São Cristóvão. Também é possível ligar para os seguintes números:
– Disque 100
– Disque 190
A Prefeitura de Porto Velho tem realizado ações para conscientização e combate à violência contra a pessoa idosa, como o “Junho Violeta”, onde a campanha promove o respeito e a dignidade na terceira idade, com atividades de conscientização e serviços de assistência.
É importante lembrar que a violência contra idosos é uma questão séria e que a conscientização e a denúncia são fundamentais para proteger essa população vulnerável.
A pena para quem comete esse tipo de crime varia entre 2 meses a 1 ano de reclusão em unidade prisional. Dependendo do nível de gravidade da violência, a pena pode ser maior.